quarta-feira, 4 de maio de 2011

"RE: Regime Fundacional: para um debate cada vez mais esclarecedor"

«A toda a Academia

Caros Colegas e Caros Funcionários da Universidade do Minho

Posição pública sobre a eventual passagem da Universidade do Minho ao regime fundacional

Perante uma notícia vinda a público no Diário Económico de 4 de Maio de 2011, sobre a passagem da Universidade do Minho ao regime fundacional, que me deixou perplexo e profundamente preocupado, não posso deixar de partilhar com toda a Academia a minha posição sobre esta questão. Do mesmo modo, não poderia ocultar aos meus Colegas e a todos os Funcionários desta instituição que hesitei profundamente em fazê-lo, pois acabo de sair de uma cirurgia nos hospitais da Universidade de Coimbra, aliás a quarta no espaço de nove meses. Faço-o, porém, por um imperativo de consciência e de cidadania, enquanto docente desta instituição há mais de vinte e sete anos, e também - devo dizer - enquanto professor catedrático na área da Ciência Política e Relações Internacionais.

Em particular, é meu dever assinalar que no quadro da minha investigação neste domínio científico tenho investigado a metamorfose do Estado bem como as novas políticas públicas, com uma incidência particular nos processos de privatização e de regulação nos sistemas políticos contemporâneos. Não me move, pois, qualquer obstinação cega ou mesmo qualquer preconceito ideológico sobre a questão fundacional. Move-me, sim, uma chamada à prudência e à ponderação exigente, criteriosa e cuidada sobre uma mudança significativa numa instituição universitária altamente prestigiada, quer no plano nacional, quer no plano internacional.

Estimo, assim, entre outras vertentes, sete razões de fundo para não dar este passo nesta altura:

1 - Com todo o respeito pelas prerrogativas formais dos órgãos estatutários, considero que se verifica uma falta de legitimidade política dos actuais titulares da Universidade, em particular do Reitor e do Conselho Geral em avançar com esta iniciativa, tendo em conta que não foram eleitos ou designados com base em plataformas que expressamente explicitassem como objectivo central dos respectivos mandatos a passagem ao regime fundacional da Universidade do Minho. Pergunto: Porque não foi aceite a sugestão de auscultar, democraticamente, toda a instituição sobre esta matéria?

2 - A ambiguidade e mesmo o vazio, iniludíveis, que permanecem em muitas matérias atinentes ao regime fundacional, casos do património da Universidade, do estatuto dos professores e funcionários, e do futuro modelo de financiamento público.

3 - A ausência de uma discussão e de uma reflexão muito mais exigente e aprofundada no seio da Universidade do Minho que clarificasse todos os aspectos da questão. Qualquer universitário não pode deixar de formular a seguinte questão: Onde está o estudo que suporta a transformação da UM numa "fundação" e que deveria ter servido de base à reflexão exaustiva, à discussão ponderada, e à decisão sobre esta matéria? Considero, assim, com toda a frontalidade, que a metodologia que presidiu a este processo está errada;

4 - Em todos os referendos parciais realizados nas Escolas e nos Institutos da Universidade do Minho, os docentes e os funcionários pronunciaram-se, sem excepção, contra a passagem para o regime fundacional;

5 - O incumprimento total por parte do governo da República nomeadamente no que respeita aos contratos-programa com a Universidade de Aveiro e com o ISCTE, instituições que "optaram" por aquele modelo estatutário, mas que não receberam qualquer verba constante daquele programa (como ainda hoje foi noticiado).

6 - O facto inultrapassável e elucidativo de quatro grandes universidades portuguesas, a saber, a Universidade de Coimbra, a Universidade de Lisboa, a Universidade Técnica de Lisboa e a Universidade Nova de Lisboa não terem avançado para este objectivo. Pergunto igualmente: Porque será?

7 - O erro de considerar como uma das "vantagens" do regime fundacional a possibilidade da Universidade do Minho poder endividar-se. Ora, afigura-se-me uma aventura muito perigosa sustentar tal orientação no contexto dos gravíssimos endividamentos público e privado a que Portugal faz face.

4 de Maio de 2011.

Luís Filipe Lobo-Fernandes
Funcionário nº 620 da Universidade do Minho
Professor Catedrático de Ciência Política e Relações Internacionais
Actual Calouste Gulbenkian Fellow na School of Advanced International Studies da Johns Hopkins University, Washington»

(reprodução integral de mensagem entretanto distribuída universalmente na rede electrónica da UMinho pelo seu autor, aqui reproduzida sob sua expressa autorização)

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