Conforme consta da
nota informativa entretanto divulgada pelo Conselho Geral (CG) da Universidade
do Minho (UMinho), este órgão decidiu na sua reunião de 21 de Maio pp. adiar
para 16 de Julho pf. uma decisão sobre o valor das propinas a cobrar no ano
lectivo 2012/2013 nos seus cursos de 1º
Ciclo e Mestrados Integrados. Curiosamente, fê-lo pouco depois de o Senado
(órgão consultivo do Reitor) ter aprovado com apenas 3 votos contra (2 alunos e
1 professor) a proposta de aumento que lhe havia sido submetida pelo reitor.
Das tomadas de
posição sobre o assunto que vão chegando de várias instituições de ensino
superior, percebe-se que a matéria é complexa e suscita embaraços a quem é
claramente a favor do aumento das propinas, mesmo que o montante do aumento que
esteja em causa não seja grande. No caso da UMinho o valor do aumento proposto
era de aproximadamente 38 euros, o que fixava as propinas no montante máximo
legalmente permitido.
Importa, a
propósito, que não se deduza que na deliberação tomada na reunião tenha pesado
significativamente o expectável voto negativo dos representantes dos
estudantes. Não foi esse o caso, tanto mais que o histórico da votação dos
estudantes nesse dossiê é o da persistência de votos contrários aos aumentos de
propinas, mesmo que noutros dossiês tão ou mais gravosos para os estudantes (e
sobretudo para a qualidade do ensino ministrado e a boa gestão da organização) se
disponham recorrentemente a secundar as posições de quem, em sede do órgão, se
limita a dizer “ámen” a tudo quanto vem do reitor. Pese isso, conforme escrevi
na sequência da reunião, “surpresa
foi a qualidade do discurso veiculado pelos mesmos, que não custava
subscrever”. Para fundamentar a posição que aí mantive, mais escrevi “que a
matéria merecia (merece) reflexão, nomeadamente em expressão da
conjuntura socioeconómica e política” vividas pelo país.
Fazendo um breve apanhado das notícias
que ultimamente têm chegado sobre o que se vai passando a este respeito noutras
instituições de ensino superior, registem-se os casos seguintes:
i)
contra a
posição do reitor, o Conselho Geral da Universidade do Porto decidiu há poucos
dias não proceder ao aumento das propinas dos seus cursos de 1º ciclo;
ii) posição no mesmo sentido
foi tomada pelo Conselho Geral da Universidade do Açores, adiantando o
presidente do órgão à comunicação social o que "Verificou-se uma absoluta unanimidade do Conselho Geral no sentido
de não haver aumento de propinas"; para Ricardo Madruga da Costa, “a atual
situação económica de muitas famílias ´não aconselha, de forma nenhuma, que
haja aumento de propinas`, apesar de reconhecer a necessidade que as
instituições de ensino superior têm de arranjar mais receitas.” (Açoriano
Oriental, 2012/05/23);
iii) por deliberação do Conselho
Geral do IPCA, de 20 de Abril, foi igualmente decido que não seriam aumentadas
as propinas de licenciatura no próximo ano letivo, fixadas em 780 euros,
"apesar da redução das transferências do Estado" para o IPCA. Esta decisão foi justificada "pela
crise económica que o país atravessa, tendo em conta, designadamente, o aumento
do desemprego, as reduções dos rendimentos familiares e o consequente
crescimento do número de desistências por parte dos estudantes, bem como dos
pedidos de adiamento do pagamento das prestações de propinas";
iv) em sentido diferente
deliberou o CG da Universidade de Évora, publicamente justificado pelo seu
reitor com as afirmações de “que ‘não se trata de um
aumento` das propinas, mas sim da ´actualização anual, de acordo com o Índice
de Preços no Consumidor, como está previsto na lei`. ´Em vez de aplicarmos este
aumento noutras actividades, vamos aplicá-lo num fundo para apoiar alunos em
dificuldades financeiras`, tal como o CRUP tinha recomendado às instituições de
ensino superior” (Público, 2012/05/08).
A invocação destas
situações pretende sublinhar a delicadeza do tema, mas serve também para, por
um lado, pôr em evidência a forma diferenciada como se pode actuar num quadro
de fundo rigorosamente igual, e, por outro lado, para trazer para primeiro
plano os argumentos por detrás da controvérsia. A essa luz, é especialmente
simbólico que o IPCA tenha decidido criar um fundo de apoio aos estudantes a
enfrentar maiores dificuldades económicas, apesar de ter decidido manter o
valor das propinas, enquanto que o aumento desse valor é a razão invocada pelo
reitor da Universidade de Évora para as aumentar, seguindo o que “o CRUP tinha
recomendado”.
Esta matéria (constituição
de um fundo social de apoio aos alunos mais carenciados) foi talvez a dimensão
mais controversa presente no debate que sobre o tema se manteve na reunião do
CG da UMinho, tendo relevado daí, em grande medida, a consistência da posição
defendida pelos estudantes, pela boca de Luís Rodrigues. Esse tópico apareceu
igualmente destacado nas declarações produzidas para o Correio do Minho (edição de 2012/05/23) por Hélder Castro, actual presidente
da Associação Académica da Universidade do Minho (AAUM). Disse este que, “nesta
altura, ´não é possível de todo um aumento de propinas, independentemente da
sua finalidade`”. Mais terá sublinhado “que a AAUM manterá, em Julho, a sua
posição contra o aumento das propinas, já que, até lá, as condições socioeconómicas
dos estudantes não se alterarão.”
Na verdade, esta
história do “fundo de apoio aos estudantes carenciados” tem que se lhe diga. Em
primeiro lugar, porque a invocação da necessidade da sua criação torna patente
a crescente demissão do Estado de, através dos mecanismos instituídos de acção
social, atender às dificuldades vividas pelos estudantes provenientes de
famílias de menores rendimentos. Por outro lado, a respectiva criação
configuraria/configura, de algum modo, a substituição do Estado nessa
componente de promoção do acesso ao ensino “universal” dos jovens portugueses
pelas instituições de ensino superior e, logo, pelas famílias, legitimando
porventura uma ainda maior retirado do Estado da obrigação constitucional de
promover a qualificação dos portugueses e o seu bem-estar, independentemente
das suas origens sociais.
Obviamente, há
outras dimensões por detrás deste debate, a começar pela problemática da
comparticipação dos beneficiários imediatos nas despesas dos serviços de que
tiram proveito econónmico, com suporte na teoria do investimento em capital
humano e mantendo presente que esses benefícios tem uma componente de retorno
que é estritamente privada, isto é, de ganho do individuo que usufrui do
investimento (público). Outra dimensão possível de abordagem prende-se com a
circunstância de as famílias estarem a ser duramente castigadas pelo Estado em
matéria de rendimentos (via aumento de impostos e redução directa de salários),
não sendo por isso um aumento do encargo com as propinas um pequeno acréscimo
de esforço que se lhes pede mas, antes, um esforço a somar a muitos outros, que
as estão a levar à exaustão. Isto releva porque, no quadro actual massificado
de acesso ao ensino, não é legitimo afirmar que o encargo adicional que está em
causa recairá sobre os mais favorecidos, e portanto se configura uma medida
redistributiva do rendimento. Também há questões sobre a relação entre as
Instituições e a sua envolvente e, logo, que relevam da dimensão responsabilidade
de social daquelas para com a comunidade onde estão inseridas, e que é suposto
servirem de forma mais imediata, que importa não desconsiderar.
De forma breve, tudo
isso informou o debate sobre fixação de propinas se realizou na reunião do
Conselho da Universidade do Minho de 2ª feira pp., sendo de louvar que, como
primeiro passo, o reitor tenha acabado por retirar a proposta que havia
submetido. Se isso não garante que o bom senso venha a prevalecer na reunião
planeada para 16 de Julho, mostra, pelo menos, que a expressão (ainda)
maioritária do Conselho não ficou cega, surda e muda perante este dossiê económica
e politicamente sensível.
J. Cadima Ribeiro
(artigo de opinião publicado em ComUM “online”, em 2012/05/27)
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