«Para quem esteja interessado um artigo meu publicado hoje - 2/12/2013 - no Jornal i, sobre este tema.
Cump
Raquel Varela
Concurso FCT 2013 e outros concursos: Um colossal despedimento colectivo nas universidades?
Este concurso e outros camuflam a decisão de despedir nas universidades, descapitalizando-as, pressionando os que ficam para dar o dobro das aulas, assumir trabalho burocrático e até contabilístico, para suprir o despedimento dos outros
O GOVERNO VAI ASSINAR , dia 2 de Dezembro, com pompa e circunstância, os contratos Investigador FCT. Mas, o que está em causa não é só a contratação, mas o despedimento colectivo de centenas de doutorados, feito com o mesmo concurso.
Este não é um problema só de investigadores: é a qualidade das universidades que está em causa e o trabalho dos que ficam, a quem é exigida uma carga horária suplementar. Reitores e directores, docentes, bolseiros, investigadores, sociedade em geral, são chamados a olhar com urgência para este despedimento, que na aparência jurídica é feito sob a forma de candidaturas de investigadores e centros "a projectos competitivos" mas, na essência, trata-se de um despedimento colectivo, porque estes investigadores exercem funções permanentes e indispensáveis.
A FCT, argumentando que está à procura de uma solução para a precariedade dos investigadores, criou um concurso - FCT Investigador -, cito, "altamente competitivo", que assentaria "no mérito" e teria um "júri internacional de renome" na sua avaliação.
Verifica-se que, na prática, não há um júri internacional de selecção. A maioria dos candidatos é eliminada no processo interno de selecção, cujos avaliadores são, até hoje - e já comunicados os resultados -, desconhecidos. Para terem os leitores uma ideia, no Brasil, por exemplo, cada concursado é submetido a um júri de 3 avaliadores em provas públicas. O número de vagas abertas aqui neste concurso corresponde a uma ínfima percentagem dos candidatos, 10% ?, distribuídos de forma desigual pelas várias áreas científicas. Na prática, podem ter concorrido mais de 1500 doutorados - ainda não se sabe o número final - e terem sido afastados 1300 (também não sabemos)?! A maioria dos quais por avaliadores - individuais ou não, ninguém sabe também - que suprimem a maioria das candidaturas antes de irem a júri internacional, subvertendo o regulamento do próprio concurso. A urgência dos cortes orçamentais ditou que este processo tenha assim sido tão obscuro (passível, pergunto-me, de impugnação judicial?). Nunca, na história da FCT, algo semelhante se tinha passado.
Desde há dois dias estão desempregados centenas de investigadores, com vidas, contas para pagar, filhos pequenos. Durante anos deram aulas nas universidades, orientaram teses, acarinharam alunos, concorreram e ganharam projectos nacionais e internacionais. Não desistiram de viver e trabalhar em Portugal. O direito ao trabalho, nas nossas sociedades, é preciso recordá-lo, é o direito à vida.
Há aqui um processo de selecção que reflecte a luta competitiva por espaços que nada tem a ver com as necessidades de desenvolvimento científico-tecnológico de uma sociedade e que revela o descompasso entre a ciência de excelência e a selecção cega e burocrática ditada por cortes orçamentais.
Mas evidencia algo mais. Este governo quer encerrar politécnicos e mesmo, quem sabe, universidades; quer encerrar unidades de investigação e fá-lo em nome de concursos "competitivos" e "científicos", o que se reflecte também na discrepância das unidades que têm os seus projectos aprovados. Se encerrasse sabe que iria enfrentar oposição, assim, faz essa política de "mansinho" na esperança de que nós, cientistas, não nos demos conta da calamidade. Por isso, a maioria dos candidatos, mais de 50%, não tem qualquer possibilidade de ver o seu CV analisado pelo júri internacional, sendo eliminada previamente. A maioria dos que ultrapassam esta pré- -selecção não consegue passar no espaço irrisório do número de vagas. Destino semelhante terá o concurso de unidades de investigação?
Este concurso e outros camuflam a decisão de despedir nas universidades, descapitalizando-as, pressionando os que ficam para dar o dobro das aulas, assumir trabalho burocrático e até contabilístico, para suprir o despedimento dos outros.
A excelência da ciência nacional e a qualidade dos currículos a concurso determinaria que todos ou praticamente todos os concursados deveriam ter um contrato de trabalho. O que se está a fazer não é meritocrático nem científico. É pura eliminação de riqueza social, capacidade produtiva e, o mais importante de tudo, destruição de vidas.
Historiadora do trabalho
Investigadora FCT, IHC (FCSH-UNL)
e IISH (Amsterdão)»
(reprodução de mensagem que nos caiu entretanto na caixa de correio eletrónico, reenviada por Paula Cristina Remoaldo).
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