sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Fundação Universidade do Minho? Dar a voz à Academia

O Reitor da Universidade do Minho (UM), Professor António Cunha, apresentou ao Conselho Geral da Universidade, uma proposta para a passagem ao regime fundacional, nos termos do artº 129º do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES). Para sustentar a sua proposta, apresenta um conjunto de cinco razões principais que, no seu entender, justificam a transformação da UM numa Fundação Pública de direito privado. Dessas razões ressaltam o reforço da autonomia, nomeadamente na vertente de gestão e de contratação de recursos humanos, a flexibilização da gestão do património e dos recursos financeiros, a possibilidade de endividamento e o incremento da interacção com a sociedade.

Fá-lo no contexto de um quadro legislativo que, em relação às fundações universitárias, é demasiado vago e que, por isso, pouco ou nada garante quanto ao verdadeiro exercício dos reclamados acréscimos de autonomia, ou mesmo de flexibilização da gestão ou incremento da interacção com a sociedade. Basta estar atento ao que se passa nas universidades que optaram pelo modelo fundacional (Porto e Aveiro), para se perceber que pouco ou nada terá melhorado, no que toca aos aspectos de gestão, vulgo desburocratização, associados ao funcionamento público. Por outro lado, a proposta do Reitor da UM nada diz sobre as expectáveis implicações que esta mudança de estatuto terá sobre a organização, a gestão e o financiamento da instituição. Algo que terá de ser devidamente avaliado, para que, quer o Estado quer a instituição, possam aquilatar das vantagens em se proceder a esta tão profunda e radical transformação da UM.

São muitos os inconvenientes que os opositores da passagem a Fundação poderão, de facto, encontrar: desde a diminuição efectiva da autonomia em relação ao poder político (conselho de curadores nomeado pelo ministro) até à ausência de garantia quanto ao financiamento pelo Estado, passando por uma maior dependência em relação ao financiamento próprio (propinas, receitas de projectos de investigação e de prestação de serviços) que pode pôr em causa áreas de saber fundamentais numa Universidade, apenas porque as lógicas de mercado tendem a funcionar menos bem para essas áreas.

O Conselho Geral da UM tem, por isso, a enorme responsabilidade de decidir, ou não, a proposta de passagem da UM para Fundação. Ora, para deliberar bem terá de ter informações, estudos sobre as implicações mas, também, de conhecer o sentir da Academia minhota.

Consciente da importância do assunto, o Conselho Geral e o Reitor pediram, e muito bem , que a Academia debatesse o tema. Estão a decorrer debates, conferências, tertúlias, onde se pretende discutir e reflectir sobre o assunto. Pelo que tenho sentido, a participação tem sido algo tímida. Colegas meus têm-me argumentado em dois sentidos: por um lado, é sentimento que a passagem a Fundação será inevitável dada a relação de forças existente actualmente no Conselho Geral; noutro sentido, argumentam-me que de nada vale discutir o assunto porque a decisão é de apenas 23 pessoas, isto numa Universidade com mais de 17.000.

Se em relação à primeira questão me parece que a preocupação é injustificada, pois estou certo de que todos os membros do Conselho Geral agirão de forma independente, pela sua própria cabeça, e apenas centrados naquilo que avaliarem ser o supremo interesse da instituição, acabo por ser sensível ao segundo argumento. Efectivamente, os membros eleitos para o Conselho Geral, não o foram para decidir a passagem, ou não, da UM a uma Fundação que será regida por direito privado. Tal, sem os diminuir na sua competência legal e estatutária, retira-lhes, desde logo, alguma legitimidade democrática, para tomar essa decisão. A menos que o façam, num sentido de total responsabilidade, procurando representar os corpos pelos quais foram eleitos. Ora, para que assim aconteça, é fundamental que os eleitos saibam o que pensam em relação ao tema, os seus eleitores. Por isso, na minha opinião, a legitimidade democrática da decisão deverá assentar numa consulta efectiva aos diversos corpos, na forma de um “referendo” que, sem ser vinculativo, deveria orientar a natureza da decisão, em sede de Conselho Geral.

Só com o conhecimento dos resultados de uma consulta livre e democrática, com base no voto secreto, a todos os professores, investigadores, funcionários não docentes e alunos, poderão os membros do Conselho Geral ajuizar e decidir, para bem da Universidade do Minho, sobre a passagem ou não a Fundação. A eles lhes compete, de facto, tomar a decisão. Esperemos que o façam em respeito pelos que aqui trabalham e aprendem e pela sociedade envolvente que justifica a própria Universidade.

Dêem voz à Academia!

Fernando Castro
Professor Catedrático da Escola de Engenharia da UM

(reprodução de texto de opinião publicado na edição de hoje do Diário do Minho)

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