terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

"O Modelo Fundacional e a autonomia universitária"

«(ou uma discussão pública para decisões restritas)
A Universidade do Minho está envolvida num debate interno sobre a eventual mudança do atual regime jurídico, correspondendo à iniciativa do Reitor de apresentar ao Conselho Geral a proposta de transição para o modelo de fundação pública com regime de direito privado (FPRDP).
Ora um debate, por mais amplo que seja, só faz sentido se os seus participantes nele intervierem livremente até à tomada das decisões, ou seja, um debate público pede uma participação pública nas decisões que dele resultarem. O contrário não passará de um simples, embora mal disfarçado, exercício de demagogia. Faz portanto todo o sentido invocar a legitimidade democrática quando se lança uma discussão pública mas se restringe a decisão apenas a um órgão, ainda que democraticamente legitimado.
Além do mais, tenhamos em boa conta que,
No programa de ação do Reitor para o quadriénio 2009-2013, apresentado ao Conselho Geral em novembro de 2009, que constituiu o documento enquadrador do seu mandato, dizia-se, a páginas 28, secção 5.2 Medidas transversais:
“MT15 Análise da eventual alteração do regime jurídico da Universidade para fundação pública com regime de direito privado.”
Passando a Estratégia/Metodologia por
“AT15.1 Propor ao Conselho Geral a criação de um Grupo de Trabalho para estudar o assunto e lançar um debate interno sobre o mesmo.”
Com a finalidade de
“analisar as vantagens e as desvantagens do modelo fundacional, face à realidade da Uminho”.
As referidas medidas transversais, dizia-se, visavam responder aos desafios estruturais e seriam concretizadas através, neste caso, de duas ações, a saber:
1. Análise da eventual alteração do regime jurídico...;
2. Proposta, ao CG da criação de um Grupo de Trabalho para estudar o assunto e lançar um dabate interno sobre o mesmo. (sublinhados nossos);
Tanto quanto é possível constatar, a ideia mestra centrava-se nas palavras análise, eventual, propor a criação de um Grupo de Trabalho, estudar e lançar um debate interno; em lugar algum se fala em implementar ou em, claramente, propor ao CG a alteração do regime jurídico da Universidade! Estaremos nós somente a jogar com as palavras? Será cristalino para todos que a intenção era, sempre foi, claramente, alterar o regime jurídico? Ou antes, jogou-se, isso sim, com as palavras, para tornar, então, imperceptível, a intenção que agora se desenha? Não querendo fazer juízos de valor nem conjeturar intenções, cada um faça a sua própria avaliação.
Por outro lado,
Sendo, como se defendeu, o Conselho de Curadores uma instância de controlo, vai certamente querer controlar; ora, consultando o dicionário Priberam da Língua Portuguesa [1], obtemos:
(francês contrôler) v. tr.1. Examinar, fiscalizar, inspecionar. 2. Exercer o controlo de. 3. Ter sob o seu domínio, sob a sua vigilância. (É galicismo).
Mas se não passar, como também se afirmou, de um órgão discreto, com competências de mera verificação e certificação, então poder-se-ia perguntar, para que servirá?
Admitindo que a primeira interpretação será a mais assertiva e provável, poderemos vir a assistir, de facto, a um progressivo incremento do já muito claro distanciamento entrerepresentados e representantes, sem que se excluam possíveis novas ameaças ao funcionamento democrático da Universidade.
Finalmente, a propósito do modelo fundacional e da vaga neoliberal de liquidação do Estado, e comentando a crise económico-financeira que se desenhava no plano internacional, ouçamos o Professor Partha Ghosh do MIT [2], no resumo que anunciou a sua palestra aquando da visita à Universidade do Minho em 2009 a convite do então presidente da Escola de Engenharia, Professor António Cunha: «In the next 25 years the world economy will undergo profound changes which civilization has never experienced before. On supply side new technologies, from Genetic Engineering to Info, Nano to Opto technologies, and on demand side to enable betterbalance of energy, ecology, and equity, industries and governments will need to reinvent the basic tenants of capitalism implying fundamental transformation of industry and economic models. ... In the future, business models will not be consumption centric but they will be conservation centric, economic equations will not be "zero sum but plus sum", wealth creation will not be elitist but all inclusive».
Com o devido respeito, atrever-nos-íamos a juntar um quarto E para mais uma regra de um sistema de quatro equações em ordem às incógnitas Energia, Ecologia, Equidade, Ética! Os 4 grandes desafios que a Humanidade, mais cedo do que tarde vai ter de enfrentar, não tanto para o seu desenvolvimento, mas talvez e apenas para a sua sustentabilidade, ou até, talvez, sobrevivência!
Quer queiramos quer não, o festim de consumismo, desperdício e exaustão de recurso das últimas décadas foi bom enquanto durou, mas acabou! Assim, talvez nunca tão atual como há quase cinquenta anos...
“Come gather 'round people / Wherever you roam
And admit that the waters / Around you have grown
And accept it that soon / You'll be drenched to the bone.
If your time to you /Is worth savin'
Then you better start swimmin' / Or you'll sink like a stone
For the times they are a-changin'.”
Bob Dylan, The Times They Are A-Changin', 1964

Universidade do Minho, 20 de fevereiro de 2011

Mário Lima
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PS: elaborar sobre a pretensa perversidade ou falta de seriedade de argumentos legítimos, utilizados num debate universitário e público para defender ideias (de seres livres e pensantes), constituiu um juízo de valor que ronda a sobranceria e até a indelicadeza. Tal como nos aspetos verdadeiramente importantes, também aqui cada um faça o seu próprio julgamento...»

[reprodução integral de mensagem ontem distribuída universalmente na rede electrónica da UMinho, com origem no colega identificado]

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