«Na UBI não acreditamos que a solução do Interior passe pelo encerramento de
instituições no Litoral. Acreditamos que temos todas as condições para sermos
uma universidade do mundo.
A Universidade da Beira Interior é aqui o caso em que da
fraqueza se fez força. O aparecimento este ano na lista das mil melhores
universidades da Times Higher Education (THE), mais concretamente
entre as 600 e as 800, ao lado da secular Universidade de Salamanca, é um feito
para uma pequena universidade que tem apenas 30 anos e se encontra no Interior
de Portugal. A UBI junta-se com o ISCTE às seis universidades portuguesas que
já antes constavam da lista da THE, todas elas situadas no Litoral, melhorando
com isso o posicionamento do nosso ensino superior à escala mundial. Como foi
possível?
Situada na Covilhã, a UBI é a universidade mais improvável
de Portugal. Não está na capital de um círculo eleitoral à Assembleia da
República, não tem distritais políticas por si, não tem tribunais de relação,
nem indústrias de peso, não tem um bispo, nem catedral, nem sé, e não tem a
sede de uma CCDR milionária. É a universidade mais subfinanciada no sistema de
ensino superior português (25% abaixo do padrão) e é a que está mais longe de
um aeroporto e das companhias low cost, tão importantes para a
mobilidade internacional dos estudantes. Ainda hoje gabinetes governamentais e
para-governamentais se enganam na sua identificação, denominação e localização,
chamando-lhe, por exemplo, universidade da Covilhã, ou então julgando-a em
Castelo Branco ou na Guarda.
Como é possível então que a UBI apareça num ranking
tão prestigiado como o da Times Higher Education? Porque ao longo
destes 30 anos tem sabido crescer em tamanho, ciência e sabedoria.
Das novas universidades foi a mais lenta no seu
crescimento. Enquanto as outras cresceram rapidamente com a integração das
Escolas do Magistério Primário e das Escolas de Enfermagem, presentes em todas
as capitais de distrito, e apostaram fortemente na então necessária formação de
professores para os ensinos básico e secundário, a UBI não teve nenhuma dessas
escolas a adubá-la no seu crescimento. Hoje com a formação de professores
praticamente congelada, a UBI não sofreu a correspondente diminuição de alunos.
E beneficiou, é claro, da criação da Faculdade de Ciências da Saúde,
nomeadamente do curso de Medicina no início deste século.
A UBI cresceu também em tamanho, recuperando, com verbas
comunitárias, as antigas fábricas têxteis, entretanto já ruínas industriais,
convertendo-as em faculdades. À excepção da Faculdade de Ciências da Saúde, as
outras quatro faculdades, Artes e Letras, Sociais e Humanas, Ciências,
Engenharia, encontram-se em antigas fábricas. Foi a recuperação extraordinária
de um património urbano, eventualmente caso único no país. A matriz laboriosa
da Covilhã, Cidade Neve, mantém-se no dia-a-dia da universidade. De manhã,
quando nos levantamos, não são os teares que nos esperam, mas as salas de aula,
as bibliotecas e os laboratórios.
Cresceu em ciência, apostando nas áreas canónicas do ensino
universitário. Continua a prezar os departamentos universitários clássicos,
como os de matemática, física e química, porque são um núcleo duro
indispensável à formação sólida de um engenheiro ou de um profissional da
saúde. Não cedeu à moda dos cursos híbridos, em que, respondendo aos ares dos
tempos e aos facilitismos das múltiplas estações, criaria engenharias sem
matemática e física, ou outros cursos estilo ramos de flores, sem tronco ou
raízes. A UBI sempre cultivou a sustentável gravidade da ciência. Das
instituições de ensino superior mais recentes a UBI é a que tem mais produção
científica indexada (ISI, Scopus).
Mas teve sobretudo a capacidade de crescer com sabedoria.
As novas universidades criadas em 1973 por Veiga Simão, Minho, Aveiro, Nova de
Lisboa, Évora, em muito beneficiaram da vinda dos professores universitários de
Angola e Moçambique, retornados a Portugal a seguir às respectivas
independências. A UBI, criada 12 anos depois, já não teve essa oportunidade.
Mas, quando se deu a queda do Muro de Berlim, e consequente crise económica nos
países do Leste Europeu, a UBI soube ir buscar dezenas de excelentes cientistas
à Polónia e à Rússia. Vieram matemáticos, físicos, professores de engenharia
civil, mecânica e aeronáutica que colocaram a universidade num patamar
científico superior.
E a UBI sempre soube inovar. Foi a primeira universidade a
criar um curso de Engenharia Aeronáutica, um curso de Cinema, e a primeira a
juntar na Faculdade de Artes e Letras o estudo, a investigação e o ensino das
humanidades e dos meios digitais. Tem o jornal online mais antigo das
instituições de ensino superior (o Urbi et Orbi,
desde Janeiro de 2000), e a biblioteca online mais antiga (bocc.ubi.pt, 1999). E, sobretudo, soube inovar
no ensino da Medicina, apostando num modelo arrojado, centrado no aluno e na
resolução de problemas.
Mas verdadeiramente a inclusão da UBI na lista da Times
Higher Education é o reconhecimento de uma instituição cujo ser vai muito
além do parecer. Não conheço ninguém que tenha visitado a UBI e não tenha
ficado visivelmente surpreendido. Desde logo pelas instalações, pela
Biblioteca, digna de uma Ivy League, pelos laboratórios, equipados e com vida,
pela Reitoria instalada num convento do século XVI com uma vista magnífica,
pelos espaços comuns de restauração, lazer e desporto. E depois, o mais
importante, pelo ambiente de estudo, pela seriedade da vida académica e
sobriedade de gestão. Estou convencido de que, pegando na lista da THE e
ordenando-a apenas por custo de aluno, a UBI ficaria nos lugares de topo. A UBI
em 2015 recebeu do OE 3356 euros por aluno inscrito contra 3700 das
universidades do Porto e de Lisboa. Em Espanha não há universidade com menos de
6000 euros por aluno.
Obviamente que a UBI enfrenta o risco da progressiva e
inevitável falta de alunos. É um problema já candente nas instituições de
ensino no Interior do país, mas sê-lo-á também, num futuro não longínquo, para
as universidades do Litoral. É que das mil turmas que encerraram este ano no
ensino básico e secundário já foram poucas as do Interior, porque no Interior
já são poucas as existentes. Na UBI não acreditamos que a solução do Interior
de Portugal passe pelo encerramento de instituições no Litoral. Acreditamos sim
que temos todas as condições para sermos uma universidade do mundo, e em
particular do mundo dos 260 milhões de falantes do português, no Brasil, em
Angola, Moçambique e outros PALOP. Estamos a caminho dos mil estudantes
estrangeiros e a intenção é termos sempre uma captação de alunos internacionais
superior à perda demográfica nacional.»
António Fidalgo
Reitor
da Universidade da Beira Interior
(reprodução de artigo de opinião PÚBLICO online, de 07/10/2016)
[cortesia de Nuno Soares da Silva]
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