«O médico e investigador Manuel Sobrinho Simões voltou, esta terça-feira, a pedir políticas de investimento público na ciência que incentivem a investigação fundamental e não acabem com os centros de investigação de qualidade.
A propósito da sua participação, no Parlamento, numa conferência sobre o futuro da ciência em Portugal, o director do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (Ipatimup) voltou a manifestar que o que mais o preocupa é "a destruição do tecido institucional", o não haver, por parte do Estado, "a preocupação de avaliar e ser preciso na recompensa e no reforço" financeiro dos centros de investigação de qualidade.
"Não há política científica que se aguente no futuro se não tivermos tido o cuidado de reforçar o tecido" institucional, sustentou Sobrinho Simões, que anteriormente já tinha acusado o Governo de destruir a ciência, criticando os cortes orçamentais impostos pela austeridade.
Sobrinho Simões apontou o caso do instituto que dirige que, disse, teve uma redução de 45% no seu "financiamento de base", "sem nenhuma justificação e avaliação".
O cientista adiantou que o Ipatimup se tem mantido à custa de contratos de investigação, incluindo internacionais, e da prestação de serviços, nomeadamente a hospitais como o São João do Porto, com o qual trabalha em parceria.
"Os pagamentos da FCT [Fundação para a Ciência e Tecnologia] são erráticos", assinalou.
Manuel Sobrinho Simões, Prémio Pessoa 2002, considera que os programas da FCT, entidade pública que subsidia a investigação científica, "são fragmentários".
"Não têm sido feitos com regularidade, não têm sido coerentes. Têm sido pouco transparentes, com alterações das classificações... tem havido sempre trapalhadas... têm feito com que as pessoas sintam uma progressiva desconfiança", defendeu, acrescentando que, a seu ver, a FCT "não consegue cumprir prazos, abrir os concursos, avaliar as instituições".
Para o médico, especialista em cancro da tiroide, "é assustador a incompetência e a displicência" da FCT, que "não respeita os cientistas".
As críticas, da comunidade científica, à FCT, que tem refutado qualquer irregularidade, subiram de tom este ano, após a diminuição das bolsas individuais de doutoramento e pós-doutoramento, que a instituição alega que foram compensadas por outros programas de apoio à investigação.
O director do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto entende que o futuro da política científica em Portugal passa por políticas públicas que, além de reforçarem financeiramente as instituições de qualidade, apoiem a investigação fundamental, caso contrário "é matar a ciência", defendeu.
"A investigação tem que ter alguma utilidade, mas não pode ser medida apenas pela sua utilidade imediata", invocou, exemplificando que "há muitas coisas que estão a ser descobertas no domínio da investigação para o tratamento de cancro que podem não ter resultados imediatos, mas que vão ter resultados daqui a cinco ou dez anos".
A conferência "O Futuro da Ciência em Portugal", que se realiza na tarde desta terça-feira na Sala do Senado, é uma iniciativa da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura.
O programa inclui intervenções do presidente da FCT, Miguel Seabra, do presidente do Fórum dos Conselhos Científicos dos Laboratórios do Estado, José Manuel Catarino, e de membros do Conselho dos Laboratórios Associados e do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia.
Os cientistas Manuel Sobrinho Simões, Maria Mota – que foi Prémio Pessoa 2013 – e Carlos Fiolhais, assim como o presidente da empresa farmacêutica Bial, Luís Portela, também constam na lista de oradores.»
(reprodução de notícia PÚBLICO online, de 24/06/2014)
[cortesia de Nuno Soares da Silva]
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