quarta-feira, 28 de agosto de 2013

"Universidades acusam Governo de as forçar a orçamentos ´irrealistas`"

«MEC garante que instituições de ensino superior continuam a poder captar e utilizar receitas próprias, mas esclarecimentos não satisfazem reitores
A limitação ao aumento das receitas próprias no ensino superior no Orçamento para 2014 existe, mas "nada impede que as universidades captem valores superiores aos inscritos", assegura o Governo. O Ministério da Educação e Ciência (MEC) garante que as instituições podem continuar a captar e a utilizar essas verbas, mas recomenda prudência nas estimativas. As explicações não convencem os reitores das universidades públicas: "O Governo está a pedir-nos que façamos orçamentos irrealistas".
Na segunda-feira, os reitores tinham recusado submeter os orçamentos para o próximo ano, contestando a determinação inscrita numa circular da Direcção-Geral do Orçamento (DGO) que estabelecia um limite máximo de receitas próprias. O MEC veio entretanto esclarecer que as instituições de ensino superior deverão ter estimativas cautelosas das receitas próprias e das despesas associadas."Pretende-se assim evitar que ocorram situações de sobreorçamentação com os correlativos défices", afirma a tutela, em comunicado.
A regra geral será a manutenção das receitas próprias semelhante às efectivamente recebidas em 2012, mas as universidades e institutos politécnicos poderão, no entanto, inscrever um valor superior ao de 2012, desde que o fundamentem. Por isso, o ministério de Nuno Crato defende que "nada impede que as universidades captem valores superiores aos inscritos e que utilizem esses valores, nomeadamente para despesa associada", desde que "não se crie défice". As universidades podem assim continuar a poder captar e a utilizar as suas receitas próprias, considera o MEC.
Esta justificação não foi bem acolhida pelos reitores. "É uma resposta de mau pagador", acusa o reitor da Universidade do Minho, António Cunha, para quem o MEC percebeu que a norma da DGO "não tem pés nem cabeça", recusando-se, porém, a "dar a mão à palmatória". "Não temos qualquer prática de sobreorçamentação. Ela pode existir noutras áreas da administração, mas nas universidades o valor global da receita prevista é o que é", defende também aquele responsável.
António Cunha entende, por isso, que o Governo está a forçar as instituições a fazer "orçamentos irrealistas", que depois não vão cumprir. "Os orçamentos são instrumentos de gestão nobres. Não podemos partir para a sua execução sabendo que não os vamos cumprir", concorda o reitor da Universidade de Aveiro (UA), Manuel Assunção.
O reitor da Universidade de Coimbra, João Gabriel Silva, adverte que o comunicado do MEC "carece de uma análise mais cuidada", mas, numa primeira leitura, aquele responsável entende que o documento "não altera as questões essenciais colocadas pela circular".
Os reitores ficam por isso à espera de mais esclarecimentos do Governo ainda hoje, até porque o prazo para a submissão dos orçamentos termina no final do dia. "No essencial, as instituições têm os orçamentos preparados", garante o reitor da UA, antecipando que, assim que sejam dissipadas as dúvidas, as universidades podem lacrar os documentos.
Antes do comunicado do MEC, o secretário de Estado do Ensino Superior tinha anunciado na TSF, ao início do dia, que estava "em contacto permanente" com o Ministério das Finanças para negociar um "tratamento diferenciado" para o sector. À tarde, em declarações à agência Lusa, José Ferreira Gomes falava num "mal-entendido".
Circular 1374 da DGO é clara: "As entidades financiadas no todo ou em parte com receitas próprias ou consignadas devem, independentemente dos valores que prevêem cobrar no ano de 2014, apresentar as suas propostas de orçamento com uma redução na despesa a realizar com essas verbas". É imposta também uma "uma previsão de receita não superior ao valor da receita cobrada em 2012". De fora ficam apenas os fundos europeus, motivo pelo qual, no caso do ensino superior, não ficam abrangidos por este limite os projectos com financiamentos comunitários como a bolsas do European Research Council e as iniciativas apoiadas no âmbito do 7.º Programa-Quadro. A única excepção prevista para o ensino superior diz respeito à reserva de 2,5% do orçamento que é imposta às demais entidades do Estado e da qual estão excluídas as universidades e institutos politécnicos, bem como o Serviço Nacional de Saúde.
A limitação das receitas próprias das instituições de ensino superior não agrada à Associação Nacional de Investigadores de Ciência e Tecnologia (ANICT). Em declarações à agência Lusa, o presidente daquele organismo considera "incompreensível" a decisão. "Parece contraditório investir na contratação de investigadores de top e depois dizer que existem limitações na atracção de receitas", lamenta João Lopes.
"Absurda" é a classificação encontrada pela coordenadora do Bloco de Esquerda para se referir à situação. Catarina Martins entende que só "uma desconfiança" do Governo perante as instituições do conhecimento pode justificar esta decisão. A medida, reforça a deputada, pode "condenar as universidades e os politécnicos".»
(reprodução de notícia PÚBLICO online, de 28/08/2013 - SAMUEL SILVA)

[cortesia de Nuno Soares da Silva] 

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