«Há um século, uma turma universitária era quase inteiramente composta por homens. Hoje, as mulheres são a maioria
Há um século, uma turma universitária era quase inteiramente composta por homens. Hoje, as mulheres são a maioria em quase todos os cursos. Elas não se limitaram a recuperar terreno, ultrapassaram os homens em quase todos os países desenvolvidos. Porque é que isto acontece?
Uma categoria de explicações aponta para as diferenças de desenvolvimento ou de comportamento entre rapazes e raparigas. Dois bons sinais dessas diferenças são que as adolescentes passam mais tempo a fazer trabalhos de casa do que os rapazes, enquanto eles têm muito maior incidência de problemas disciplinares na escola. Se é esta a razão, podemos pensar que há um problema no sistema atual de ensino, pois trata raparigas e rapazes como iguais aos 13 e 15 anos, quando eles precisam de atenção especial, ou mesmo de um tipo diferente de ensino.
Uma segunda explicação nota que as primeiras gerações de mulheres formadas seguiram, desproporcionadamente, carreiras no ensino. Discriminadas noutras partes do mercado de trabalho, as mulheres rapidamente se tornaram a maioria dos professores nos ensinos primário e secundário. Ora, a identidade do professor afeta o desempenho dos alunos. Os adolescentes procuram modelos, e as raparigas terão tendência a portar-se melhor e esforçar-se mais para impressionar ou seguir o exemplo de uma professora do que um professor. Talvez mais chocante, as próprias perceções dos professores contam, e muito. Um estudo importante com dados americanos descobriu que um aluno era visto pelo professor como sendo desatento e problemático com 19% a 37% maior probabilidade se o professor era do género oposto ao do aluno. Ou seja, as professoras que dominam no nosso ensino vêm os rapazes com piores olhos do que as raparigas, o que com certeza se traduz em piores notas para eles. Ironicamente, se os homens discriminaram as mulheres no mercado de trabalho no passado, foram eles a semear as raízes do insucesso escolar dos seus filhos e netos.
Um estudo recente de três economistas com dados americanos aponta para uma terceira explicação. As raparigas já têm menos problemas disciplinares e melhores notas há varias décadas, mas só recentemente ultrapassaram os rapazes na faculdade. O que mudou foram os planos e expectativas dos jovens. Na resposta a inquéritos, as adolescentes de hoje revelam planear inscrever-se num curso superior e seguir uma carreira em maior número do que as suas mães e avós, e também mais do que os rapazes das suas turmas. Muitos rapazes planeiam antes acabar os estudos secundários e ingressar na carreira militar, em escolas profissionais, ou em profissões menos especializadas. Ou seja, talvez tenhamos menos rapazes na faculdade porque mais rapazes querem ser carpinteiros ou canalizadores.
Cada uma destas explicações tem implicações diferentes quer sobre se nos devemos preocupar com este assunto, quer sobre o que fazer em resposta. Certo é que esta vai ser uma das discussões chave no futuro dos sistemas de ensino.»
RICARDO REIS - Professor de Economia na Universidade de Columbia, Nova Iorque
(reprodução de artigo Dinheiro Vivo, de 24/08/2013)
[cortesia de Nuno Soares da Silva]
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