«O dirigente da Federação Nacional de Professores comentou recentemente o resultado de um estudo que concluía pela desmotivação para o trabalho dos docentes do pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.
Não menos importante seria efetuarem-se estudos de natureza análoga versados sobre o ensino superior. Com efeito, o ensino superior tem sido alvo de imposições significativas por parte das entidades com competências inspetivas e de acreditação, que acabam por se refletir no trabalho, no ânimo e na missão dos professores.
Entre outras exigências, é prescrito o cumprimento de um conjunto de procedimentos de natureza estritamente burocrática com preenchimento de formulários, fichas e inquéritos que servem finalidades de natureza formal, sem que daí se extraia qualquer ganho substancial. Teremos melhores professores, mais competentes, mais empenhados, mais motivados, mais disponíveis para aprender e ensinar se os colocarmos a preencher horas a fio fichas de disciplina (que, diga-se, são preenchidas à luz de um guia que tem de ser escrupulosamente cumprido), relatórios de atividade, registos de atendimento aos alunos, entre outros documentos? Que mais valia acrescenta ao curriculum profissional e académico do docente este tipo de tarefas? Em que medida fomenta a liberdade de criação intelectual, artística e científica consagrada no art. 42.º da Constituição da República Portuguesa, intrinsecamente ligada à liberdade de aprender e ensinar também constitucionalmente garantida no art. 43.º?
Em que medida contribui para aperfeiçoar os métodos pedagógicos e científicos? Que benefícios retiram os alunos deste gasto de tempo quando podia estar a ser canalizado nas verdadeiras funções de um professor, que deve despender a sua energia ao serviço da excelência do ensino?
Fica-nos a motivação e o desempenho dos alunos aplicados, atentos e assíduos que nos fornecem vigor, nos abastecem de determinação e nos acalentam a alma. É muito, mas não é tudo. Falta a perceção do que envolve “ser professor”.
Deve ser dada abertura a um espaço de discussão destas matérias para se definir o paradigma de ensino superior que se pretende e melhor se adequa às necessidades do país em geral, e do mercado em especial, e o modelo de docentes afetos a este desiderato. Uma coisa é certa:
o papel e a compreensão do professor no ensino superior estão em transformação. Cumpre agora descortinar se é verdadeiramente esta mudança que o país carece, se esta é uma das vias apropriadas de aquisição científica conducente às respostas reclamadas pelas apostas da modernidade e aos desafios da criatividade para o nosso ensino e para a formação e graduação dos nossos estudantes.
A dimensão cultural de uma sociedade é um assunto verdadeiramente sério. O ensino merece uma meditação especial e um tratamento esmerado.
(reprodução de artigo de opinião Público online, de 07/06/2014 - ANA PAULA GUIMARÃES - Docente do Departamento de Direito da Universidade Portucalense)
[cortesia de Nuno Soares da Silva]
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